domingo, 17 de agosto de 2014

Algumas Reflexões sobre a Reforma da Fiscalidade Verde e a Bicicleta (15 agosto 2014)



Por Paulo A. G. Berardo de Andrade * Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
Conteúdo

Reflexões Preliminares

Antes do mais importa realçar que a Constituição da República Portuguesa determina:
«Artigo 66.º
(Ambiente e qualidade de vida)
Todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender.
Para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável, incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação dos cidadãos:
(…)  h) Assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com proteção do ambiente e qualidade de vida».
Daí, entre outras justificações, uma principal razão para que haja Reformas da Fiscalidade Verde.
Passando a citar a minha Tese de Mestrado[2] recentemente elaborada e defendida:
«(….) É de apreciar uma publicação de referência[3] da DG do Ambiente da Comissão Europeia «Cidades para Bicicletas, Cidades de Futuro» que refere um estudo elaborado em 1997, pela Universidade de Lunds[4] (Suécia), em relação às curtas deslocações (projeto «WalCyng[5]») que coloca em evidência a quantidade enorme de deslocações que atualmente são efetuadas em automóvel e que poderiam ser efetuadas utilizando outros meios de transporte sem variação significativa do tempo de deslocação porta a porta.
Como resultado das evoluções técnicas que as bicicletas modernas sofreram, elas são hoje mais eficientes e cómodas. São um meio de transporte económico, silencioso e não poluente. A bicicleta é acessível a qualquer nível social ou etário e revela-se mais rápida que o automóvel sobretudo nas deslocações de curta distância[6] (até 5km, ou ainda mais nas situações de tráfego congestionado).
Fig.1: Comparação dos tempos de deslocação em distâncias até 8 km em meio urbano[7]

O documento da Comissão aponta para que cerca de 30% dos trajetos efetuados de automóvel na Europa têm menos de 3Km e 50% menos de 5Km. Ora é nestas deslocações que a bicicleta terá maior vantagem sobre o automóvel e este potencial não pode ser desperdiçado. Além de que cerca de 40% das deslocações são efetuadas para o local de trabalho ou para a escola sendo os restantes 60% respeitantes a compras, serviços, atividades sociais, atividades de lazer, entre outras e, em todas elas, a bicicleta pode ser uma alternativa viável.
A bicicleta não é certamente a única solução dos problemas ambientais e de circulação na cidade, mas ainda assim representa uma solução viável, perfeitamente integrável numa política de revitalização do ambiente urbano, sem no entanto representar um grande investimento económico, sendo integrável em normativos juridicamente vinculativos.
(…) Por outro lado, diga-se que são variadas as vantagens da bicicleta[8]: económicas, sociais, quanto à saúde e ambientais.
Como vantagens económicas[9] da bicicleta pode referir-se que a nível individual é um transporte barato (quanto a investimento inicial, a manutenção e a reparação) e que utilizar menos o automóvel particular significa que as pessoas podem poupar no que respeita: ao preço elevado de aquisição do veículo automóvel ou à prestação mensal do crédito; aos combustíveis (gasolina, gasóleo, GPL e, porventura, eletricidade); às revisões (óleo, pastilhas, filtros, etc.) e às reparações (peças e mão-de-obra); ao imposto único de circulação; ao seguro automóvel de responsabilidade civil – obrigatório; à inspeção periódica obrigatória; aos gastos com parquímetros e portagens; às eventuais coimas; e à depreciação do veículo. Para o País, a maior utilização da bicicleta e menor utilização de veículos a motor significa que há menos importações de veículos a motor e menos importações de combustíveis (com diminuição do défice da balança comercial com o exterior), há valorização da indústria e do comércio relacionado com a bicicleta, há valorização do comércio de proximidade (local[10]), não se gasta tanto tempo em engarrafamentos o que leva a mais tempo disponível para a produção e a criatividade.
No que respeita a vantagens sociais da bicicleta pode referir-se que a utilização da bicicleta possibilita a proximidade entre as pessoas (os ciclistas podem facilmente interagir entre si e com peões já que, quer em movimento quer com a paragem da bicicleta é fácil entabular comunicação…). Com a bicicleta democratizam-se as deslocações pois tornam-se acessíveis (a crianças, jovens, pessoas de meia idade e idosos; a pessoas quer do género feminino quer do masculino), baratas (ao alcance de qualquer pessoa independentemente do estatuto profissional ou económico) e frequentes com relativa facilidade, sobretudo nos trajetos curtos e médios. A redistribuição do espaço com menos automóveis a ocuparem as ruas, quer em circulação quer estacionados, é outro parâmetro com consequências sociais a ter em conta.



Fig.2: Espaço requerido para o transporte de uma mesma quantidade de passageiros respetivamente, da esquerda para a direita, em automóveis ligeiros, em autocarro ou em bicicletas[11]

Tal redistribuição do espaço, vantajosa do ponto de vista urbanístico, possibilita mais vida nas ruas com mais pessoas a passear, em atividades culturais e a fazer compras ou a deslocarem-se para aceder a serviços, com mais crianças a brincar ao ar livre, com mais área disponível para árvores e espaços verdes, sendo estes espaços ótimos para a convivialidade social e o lazer, e, por outro lado, possibilita a existência de mais espaço para infraestruturas públicas como passeios, estacionamentos para bicicletas, assentos públicos, anfiteatros, bicicletas partilhadas, possibilitando também um florescente comércio local e de rua, ou seja, um comércio de proximidade facilmente acessível aos ciclistas e aos peões (tanto mais na medida em que sejam criadas zonas pedonais - abertas também à circulação de velocípedes). A própria alteração dos modelos urbanísticos é necessária, tendo em vista o abandono do crescimento em «mancha de óleo» e do urban sprawl (crescimento urbano de baixa intensidade) e o revitalizar dos centros das cidades e dos bairros, no sentido da multifuncionalidade onde as várias funções (habitação, comércio e serviços) se entrelacem e a necessidade de longas deslocações diminua.
As condições favoráveis à utilização da bicicleta acabam por estar mais vezes reunidas do que se poderia imaginar à partida.
Dois dos motivos, por vezes alegados, para a não promoção da bicicleta são o da falta de segurança (risco de acidentes) e da exposição a poluentes existentes no ar[12]. Ambos não podiam estar mais longe da realidade. O nível de poluição dentro do habitáculo de um automóvel é invariavelmente superior à taxa de poluição do ar ambiente - um automobilista respira mais do dobro de monóxido de carbono que um ciclista (Dekoster 2000:13), mesmo respirando este cerca de 2 a 3 vezes mais ar que o primeiro. Os utilizadores de bicicletas apresentam, em geral, melhor forma física que os não utilizadores deste meio de transporte.
No que respeita ao risco de acidentes, também há estatísticas que revelam que aqueles são inferiores no uso da bicicleta em faixas etárias entre os 20 anos e os 60/65 anos de idade (ANSR 2011:20-22). Sendo de realçar que o perigo que os automobilistas representam para os outros é exponencial em relação direta com a velocidade e o peso; o risco que os ciclistas representam para os outros utentes da estrada é praticamente nulo. Aliás, os benefícios da bicicleta para a saúde pública, superam em larga escala as suas desvantagens (riscos de acidente).
Examinando-se todas as formas de exercício físico passíveis de serem efetuadas de um modo regular no dia-a-dia, destaca-se a utilização da bicicleta como proporcionando exercício capaz de elevar o nível do estado de saúde, podendo censurar-se as autoridades por estas não promoverem a sua utilização.
Ora, são consideráveis as vantagens da bicicleta quanto à saúde, como aliás o constata o estudo da Organização Mundial de Saúde[13], já que mais exercício físico equivale a menos doenças cardiovasculares[14], a redução do risco de diabetes e de hipertensão, a menos obesidade e colesterol, a redução da osteoporose, a menos stress e portanto a melhor estado anímico e psicológico, a mais massa muscular e, enfim, a poupança em gastos com a saúde[15], quer do ponto de vista individual como do ponto de vista dos serviços públicos de saúde (por ex. Serviço Nacional de Saúde). Tais vantagens podem ser importantemente favorecidas por políticas públicas[16] que as tenham em conta, sobretudo passando a considerar-se que, mais até do que a consideração do exercício físico em atividades de lazer, o exercício físico moderado necessário para a obtenção de ganhos em saúde pode advir de deslocações para o trabalho, escola e outras práticas utilitárias.
Já quanto às vantagens ambientais da bicicleta pode referir-se que, a circulação de maior percentagem de bicicletas e de menor quantidade de automóveis e veículos com motor de combustão, significa que haverá menos poluição sonora e menos poluição atmosférica bem como menor utilização de bens naturais, como sejam os metais e os combustíveis fósseis. É de ter em conta, também, que uma maior utilização da bicicleta e um menor uso do automóvel, pode implicar uma menor impermeabilização dos solos[17] e implica uma menor contaminação de solos e das águas. A nível da exploração dos combustíveis fósseis assim como, por exemplo, a nível de oficinas de reparação, bem como na quantidade de veículos a motor de combustão em circulação, pode conseguir-se uma menor intensidade de funcionamento o que resulta em menor poluição por tais fatores, também havendo menos problemas de gestão de resíduos, nomeadamente em face de veículos a motor em fim de vida, de peças substituídas inutilizadas ou de óleos e fluidos substituídos. Além de que uma menor utilização de combustíveis fósseis e consequentemente uma menor emissão de GEE, provocados por veículos a motor de combustão, propicia o suster das alterações climáticas
(…)
E, ainda, o Estado, ao «assegurar que a política fiscal compatibilize desenvolvimento com protecção do ambiente e qualidade de vida.» (art.º 66º/n.º2/h)), pode incentivar o uso da bicicleta por via de deduções fiscais em sede de IRS e através de uma redução da taxa de IVA aplicável[18] no caso de aquisição de bicicleta bem como o incentivo fiscal às empresas e aos funcionários destas que se desloquem para o trabalho em bicicleta[19], conseguindo deste modo, compatibilizar o desenvolvimento económico (já que a indústria das bicicletas[20], assim como o comércio, têm uma expressão assinalável em Portugal), com o impulso ao desenvolvimento social (que se traduz numa democraticidade das possibilidades de deslocação, por via da bicicleta que facilita as deslocações a um número maior de pessoas, a baixo custo, e numa humanização das deslocações, por via do contacto de proximidade que a bicicleta proporciona), com a proteção do ambiente (já que a bicicleta não é poluente) e com a qualidade de vida (já que a bicicleta proporciona saúde pelo exercício físico e permite uma vida sensivelmente favorecida em termos de mobilidade - sobretudo quando se pensa em viagens de curta e média distância, mas não só)».
Ora, tendo em conta as múltiplas vantagens nomeadamente as ambientais e as de melhoria da qualidade de vida, importa sugerir algumas mudanças na fiscalidade de modo a promover-se e incentivar-se a utilização da Bicicleta.

Mudanças na Fiscalidade (Sugestões)

Parece algo desfasado que a Comissão para a Reforma da Fiscalidade Verde (CRFV) releve desproporcionadamente[21] o interesse da bicicleta enquanto meio de transporte diário/usual e que ache que deva ser feita uma distinção entre a utilização da bicicleta enquanto meio de transporte diário/usual e o seu uso com intuito de lazer ou desportivo. Note-se que a bicicleta tem interesse ambiental qualquer que seja a sua função, seja para utilização diária/usual, seja para uso profissional, laboral, ensino, lazer, desporto ou outra, visto que a bicicleta pode, nas mãos do mesmo utilizador, ter as várias utilizações sucessivamente ou de forma combinada e qualquer delas com externalidades positivas ambientais pela diminuição da poluição, pelo incremento da saúde, no combate às alterações climáticas (pois não utiliza combustíveis fósseis que emitem gases de efeito estufa), entre outras, tendo, além disso, múltiplas vantagens económicas e sociais para os indivíduos e para o todo nacional. Porventura e no entanto, em alguns casos específicos, como na deslocação para o/em trabalho ou para a escola ou na realização de compras ou acesso a serviços públicos importa relevar determinados pontos em que fiscalmente a bicicleta pode ser promovida.

IVA

Quanto ao Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) denota-se, desde logo e infelizmente, a impossibilidade de taxa intermédia ou taxa reduzida de IVA quanto a aquisição de bicicletas pois tal não é permitido pela Diretiva Europeia de 2006 nem, portanto, pelo Código do IVA (CIVA) português. Enquanto se almeja e espera por uma alteração da Diretiva permitindo uma taxa reduzida de IVA quanto a aquisição de bicicletas, pode, também, referir-se que é, pelo menos, necessária a aposta em taxa reduzida de IVA quanto a reparação de bicicletas pois tal já é permitido pela Diretiva Europeia de 2006 mas não pelo CIVA português.
Na Diretiva 2006/112/CE[22] do Conselho, de 28 de Novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, consta o ANEXO III (LISTA DAS ENTREGAS DE BENS E DAS PRESTAÇÕES DE SERVIÇOS A QUE SE PODEM APLICAR AS TAXAS REDUZIDAS PREVISTAS NO ARTIGO 98.º) cuja alínea 19 tem o seguinte teor - «Pequenos serviços de reparação de bicicletas (…)». Já o CIVA não tem qualquer referência a estes pequenos serviços de reparação de bicicletas que devem ser incentivados por possibilitarem uma melhor e mais constante utilização da bicicleta; o CIVA não refere estes pequenos serviços nas suas Listas I e II e deveria fazê-lo. Propõe-se, por isso, que o venha a fazer sobretudo na Lista I (BENS E SERVIÇOS SUJEITOS A TAXA REDUZIDA) e o melhor será utilizar os termos «velocípedes» por ser mais abrangente e tecnicamente mais presente na legislação portuguesa (vide por exemplo artigo 112º do Código da Estrada).

IRS

Quanto ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares será de criar, no âmbito do Estatuto dos Benefícios Fiscais, uma norma que preveja um benefício quanto a aquisição de bicicletas. Pois a bicicleta tem interesse ambiental qualquer que seja a sua função, seja para utilização diária/usual, seja para uso profissional, laboral, ensino, lazer, desporto ou outra, visto que a bicicleta pode nas mãos do mesmo utilizador ter as várias utilizações sucessivamente ou de forma combinada e qualquer delas com externalidades positivas ambientais pela diminuição da poluição, pelo incremento da saúde, no combate às alterações climáticas (pois não utiliza combustíveis fósseis que emitem gases de efeito estufa).
Assim será de incluir, no Estatuto dos Benefícios Fiscais, um artigo com a seguinte redação (como atrás dito. o melhor é utilizar o termo «velocípedes»).
«Aquisição de velocípedes
1 - São dedutíveis à coleta do IRS 100 % dos montantes despendidos com a aquisição de velocípedes, incluindo peças e acessórios, até ao limite de (euro) 250.
 2 - A dedução referida no número anterior é aplicável, durante os anos de 2015 a 2017, uma vez por cada membro do agregado familiar do sujeito passivo e fica dependente da verificação das seguintes condições:
a) Que a taxa normal aplicável ao sujeito passivo seja inferior a 45 %;
b) Que o equipamento tenha sido adquirido no estado de novo;
c) Que a fatura de aquisição contenha o número de identificação fiscal do adquirente.
3 - A dedução referida no número anterior é aplicável a título experimental e sujeita a avaliação e revisão no final do período referido no nº2 podendo, posteriormente, passar a ter caráter definitivo.»
Tal proposta deverá ser comunicada à Comissão da Reforma do IRS para a necessária avaliação e consideração.

IRC

Quanto ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas será de se criarem várias normas a incluir no Código de IRC (CIRC), no que respeita em especial à deslocação em bicicleta casa/trabalho/casa, nomeadamente quanto ao artigo 43º por referência ao seu n.º 1 e ao seu n.º 15 propondo, por exemplo, a alteração deste último ao prever a possibilidade de tratamento fiscal mais benéfico em sede de IRC quanto à aquisição de bicicletas para funcionários da empresa por parte desta e/ou no pagamento das deslocações de funcionários que façam em bicicleta no trajeto casa/trabalho/casa, aproximando-nos do que já acontece noutros países europeus[23].
Assim, é de nestes últimos dois casos favorecer a utilização de bicicleta para se deslocar, de e para o local de trabalho, pelo pessoal de uma empresa que deve beneficiar de um tratamento fiscal equivalente àquele que é conferido às despesas com a aquisição de passes de transportes públicos no n.º 15 do artigo 43.º do CIRC. Uma possibilidade de redação do artigo 43.º será então como se enuncia a seguir.

«(…)15 - Consideram-se incluídos no n.º 1 os gastos suportados com a aquisição de passes sociais em benefício do pessoal do sujeito passivo, verificados os requisitos aí exigidos.

16 – Em alternativa, considera-se como não aplicável o enunciado no n.º15 e incluídos no n.º 1 os gastos suportados em equivalente à aquisição de passes sociais em benefício do pessoal do sujeito passivo quando tal pessoal se desloque em velocípede de e para o local de emprego, verificados os requisitos exigidos no n.º 1.

17 - Os gastos referidos nos números 15 e 16, quando efetuados em benefício do pessoal do sujeito passivo, são considerados, para efeitos da determinação do lucro tributável, em valor correspondente a 140%.

18 – Consideram-se incluídos no n.º 1 os custos suportados com a aquisição de frotas de bicicletas em benefício do pessoal do sujeito passivo, verificados os requisitos aí exigidos e que se mantenham no património do sujeito passivo durante pelo menos 18 meses.»
Note-se, que a determinação do montante do «equivalente à aquisição de passes sociais» acima referido no n.º 16 pode, relativamente de forma fácil, ser conseguido da correspondente empresa de transporte público logo que esta forneça documento informativo com o preço de custo de tais passes sociais, documento informativo a requerer pelo próprio pessoal do sujeito passivo em questão e a ser anexo a Mapa Interno de deslocações a elaborar pelo sujeito passivo.
Além disto e como se verifica pelo atrás exposto, é de acompanhar a CRFV quando afirma que «a aquisição de frotas de bicicletas pela empresa para utilização pelo seu pessoal deve beneficiar de um tratamento fiscal equivalente àquele que é conferido às despesas com a aquisição de passes de transportes públicos no n.º 15 do artigo 43.º do CIRC»[24].
É, também, de acompanhar a CRFV, no que respeita a que «os sistemas de bike-sharing[25] (…) devem ser incentivados»[26], por via de uma alteração correspondente do artigo 23º/nº2 do CIRC. Do mesmo modo, e nesta linha de ideias, as empresas deveriam ter um regime mais favorável no que se refere à instalação de estacionamentos apropriados para bicicletas. Assim é de acrescentar uma alínea a esta norma como se enuncia a seguir.
«Artigo 23.º “Gastos e perdas”/n.º2 do CIRC
(…) n) Gastos com sistemas de velocípedes partilhados para o pessoal do sujeito passivo e com estacionamentos para velocípedes nos locais onde exista a sede, sucursais ou outros locais onde a empresa esteja instalada»
É de realçar, mais uma vez, que, geralmente, é preferível utilizar na redação de normas os termos «velocípede/ velocípedes» por ser mais abrangente e tecnicamente mais presente na legislação portuguesa.

 IMI

Quanto ao Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) será de alargar o âmbito do incentivo à utilização de velocípede prevendo uma redução na taxa do IMI em prédios nos quais se instalem estacionamentos para bicicletas.
Portanto sobretudo em relação ao artigo 43.º do Código do IMI (CIMI) será de considerar a inclusão nas suas Tabela I (Prédios urbanos destinados a habitação) e Tabela II (Prédios urbanos destinados a comércio, indústria e serviços) no que corresponde a «Elementos de Qualidade e Conforto Minorativos» a «Existência de estacionamentos para velocípedes» com o coeficiente de 0,05.

Como nota final, considerando que o Código da Estrada engloba as Bicicletas Elétricas no conceito de Velocípedes, então é de considerar que as alterações normativas acima indicadas também se aplicam aos Velocípedes com Motor Elétrico. Estes têm, também, várias vantagens incluindo vantagens ambientais semelhantes ao acima enunciado.

Coimbra, 15 de agosto de 2014

Bibliografia

Alliance for Biking & Walking (2012), Bicycling and Walking in the United States 2012  Benchmarking Report, Washington, DC, USA
Anteprojeto de Reforma da Fiscalidade Verde, Comissão da Reforma da Fiscalidade Verde in http://www.portugal.gov.pt/media/1475725/20140709%20Anteprojecto%20Reforma%20fiscalidade%20verde.pdf
Dekoster, J.; Schollaert, U. (2000), Cidades para Bicicletas, Cidades de Futuro, COMISSÃO EUROPEIA, DG do Ambiente, Luxemburgo: Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, ISBN 9282857387 in       http://ec.europa.eu/environment/archives/cycling/cycling_pt.pdf
Dora, Carlos; Phillips, Margaret (ed.) (2000), Transport, environment and health, Copenhagen: WHO Regional Publications, European Series, Nº 89, ISBN 9289013567 in            http://www.euro.who.int/__data/assets/pdf_file/0003/87573/E72015.pdf
European Environment Agency (2008), Climate for a transport change - TERM 2007: indicators tracking transport and environment in the European Union (EEA Report Nº 1/2008), Luxembourg: Office for Official Publications of the European Communities, ISBN 9789291671175
German Institute of Urban Affairs (DIFU) (2012), Cycling to Shopping – Evidence from Research- Cycling Expertise – Analysis A-6/2012, Berlin in        http://www.nationaler-radverkehrsplan.de/transferstelle/downloads/cye-a-06.pdf
Tolley, Rodney S. (ed.) (2003), Sustainable Transport - Planning for Walking and Cycling in Urban Environments, Cambridge: Woodhead Publishing Limited, ISBN 1855736144
Wrighton, Susanne; Reiter, Karl; Plank, Christine/Forschungsgesellschaft Mobilität FGM/Austrian Mobility Research AMOR (2011), 20 good reasons for cycling,  TrendyTravel (www.trendy-travel.eu) /Bicy Project (www.bicy.it) - co-financed by the European Regional Development Fund in   http://www.bicy.it/docs/86/Trendy_cycling_EN_web.pdf



[1] Bicicleta em sentido lato, ou melhor, velocípede abrangendo bicicleta, triciclo sem motor, tandem, etc
[2] Cujo título é «O Direito, o Ambiente e a Mobilidade Sustentável: Aspetos Jurídicos da Mobilidade em Bicicleta» consultável em https://estudogeral.sib.uc.pt/handle/10316/23313 ; vide pp. 25-33
[3] (Dekoster 2000)
[5]Vide http://www.transport-research.info/web/projects/project_details.cfm?id=803&page=results: «The promotion of walking and cycling primarily requires policy action. Parking restrictions in inner city areas and improvements in public transport are commonly seen as important. Infrastructure measures to improve facilities for walking and cycling are also emphasized by city planners, together with public relations measures such as providing maps of the cycle network and communicating the availability of new facilities. Three incentive strategies are proposed by WALCYNG: -incentives, such as tax reductions for employers to establish mobility management plans for their employees; -incentives for the general public, such as Car Free Days and reduced entry fees; -direct incentives to employees, such as taxation of parking spaces. A particular policy concern would be the increase in accidents if walking and cycling were promoted without corresponding action to enhance safety levels for walkers and cyclists. One of the most important measures recommended is to ensure a maximum speed of 30 kph on streets where walkers and cyclists are present. The project recommends public support for pilot and demonstration projects, particularly to assess integrated packages of measures. Co-operation with big companies and institutions would be important here»
[6] «Cycling and walking have an important role to play in sustainable transport systems. They provide access to public transport and provide alternatives to the use of the passenger car for short local trips (…) The promotion of cycling and walking to achieve a shift away from motorized transport will address not only policy objectives related to transport, but also those focused on climate change, health, social inclusion and community cohesion, and energy security. Approximately 80 % of citizens within the European Union live in urban areas, and 60 % of these live in areas with more than 10 000 inhabitants (…). European citizens make, on average, 500 trips per year, shorter than 5 km. Cycling and walking could therefore be a realistic alternative for many of these trips (…). Cycling and walking tend to generate a variety of local benefits, particularly in terms of increased social cohesion where areas become progressively traffic free, and improved health and physical fitness when undertaken as regular exercise. Health benefits can include maintaining ideal and healthy body weight (thereby reducing associated health risks), prevention of falls and osteoporosis, and mental health and wellbeing (…). In terms of the economy, healthier employees may benefit their employers through reduced absenteeism, lower turnover rates, improved productivity and employee morale, and lower health care costs. (…) Promotion of walking and cycling could therefore help improve the health of Europe's workforces while helping reduce emissions of greenhouse gases» (European Environment Agency 2008:30-31)
[7] Fonte: (Dekoster 2000)
[8] Vejam-se os interessantes gráficos (Wrighton 2011)
[9] Relativamente aos EUA veja-se: «More Americans are choosing to bicycle for transportation, but government funding of safe bicycling projects is not keeping up. Though biking and walking account for 12 percent of all trips in the U.S., these transportation modes receive only 1.6 percent of federal transportation spending—far less than their fair share [remetendo para (Alliance for Biking & Walking 2012)] Federal transportation policy should support the development of biking, transit, and pedestrian infrastructure to ensure our roads are safe, convenient, and accessible for all. The average annual operating cost of a bicycle is $308 — versus $8,220 for the average car [remetendo para “Pocket Guide to Transportation 2009, Bureau of Transportation Statistics, 2009”]  New analysis by the League of American Bicyclists shows that bicyclists in the United States save at least $4.6 billion each year by not driving. Forty percent of all trips are made within two miles of home. Analysis by the Sierra Club shows that if American drivers were to make just one four-mile round trip each week with a bicycle instead of a car, they would save nearly 2 billion gallons of gas. At $4 per gallon, total savings would be $7.3 billion a year» in http://vault.sierraclub.org/pressroom/downloads/BikeMonth_Factsheet_0512.pdf
[10] «Cycling enhances the vitality of neighborhoods and city centers, thus strengthening the local retail sector. More bicycles and a reduced use of cars help create space to improve the quality of public space and contribute to an attractive and pleasant shopping atmosphere. In doing so, retailers need not worry about a decline in demand. Cyclists are loyal customers with strong purchasing power. In order to attract cyclist to shops, the obstacles faced by shoppers on two wheels must be countered with a wide range of services, comfortable parking facilities and safe roads. This requires coordinated action between the municipalities and the local retail sector»(German Institute of Urban Affairs 2012: 4); vide também         http://usa.streetsblog.org/index.php/2012/03/23/why-bicyclists-are-better-customers-than-drivers-for-local-business/
[11]Fotos realizadas originalmente pelo município de Munster, Alemanha, e retiradas do sítio do Programa para o Ambiente das Nações Unidas in http://www.unep.org/geo/geo4/media/graphics/Zoom/2.06.jpg  
[12] Aliás as normas relacionadas com a qualidade do ar e a poluição atmosférica deveriam apontar para medidas a tomar tendo em vista a promoção da mobilidade em bicicleta vide, a propósito, (Dekoster 2000:13) «Os autores da lei relativa ao ar adoptada em 1996 em França não se enganaram: ao estabelecer um direito a um ar de qualidade, impuseram já a promoção da bicicleta como um elemento dos planos de deslocação urbana. A partir de 1 de Janeiro de 1998, todas as obras de reparação ou de construção de vias urbanas deveriam incluir pistas para ciclistas. Além disso, o mais tardar até 1 de Janeiro de 1999, todas as aglomerações francesas com mais de 100 000 habitantes deveriam ter adoptado um plano de deslocações urbanas (PDU) tendo por objectivo diminuir o tráfego urbano poluente»
[13] Vide Geurs, Karst e Wee, Bert van (National Institute for Public Health and the Environment - The Netherlands), «The role of non-motorized modes in an environmentally sustainable transport system» in (Tolley 2003:45-46): «Significant health benefits can be expected from the attainment of an environmentally sustainable transport system. Firstly, more bicycling and walking involves more exercise. The guidelines from the World Health Organization (WHO) for healthy living (‘30 minutes of moderate exercise, such as brisk walking, every day’) will be met by more people, which may have several health benefits. The risk of coronary heart disease, diabetes, high blood pressure, and obesity may be reduced, and symptoms of depression and anxiety may be relieved» remetendo para o seguinte estudo (vide http://www.euro.who.int/en/health-topics/disease-prevention/violence-and-injuries/publications/pre-2009/transport,-environment-and-health )  - «A total of 30 minutes of brisk walking or cycling a day, on most days, even if carried out in ten to fifteen minute episodes, reduces the risk of developing cardiovascular diseases, diabetes and hypertension, and helps to control blood lipids and body weight (…) In Europe the average trip taken on foot (to reach work or for leisure or shopping) is currently about 2 km and the average cycling trip is about 3–5 km. Each takes around 15 minutes, enough to provide the above-mentioned health benefits (…) Cycling and walking are forms of physical exercise accessible to the vast majority of the population, regardless of income, age and location: it is estimated that over 96% of citizens can walk, and over 75% can ride a bicycle» (Dora 2000:31-32)
[14] «In Finland it was estimated that a 3 –7% reduction in deaths from coronary heart disease could be expected if another 8% of the working population chose to walk or cycle to work» (Dora 2000:32)
[15] A própria Organização Mundial da Saúde (O.M.S.) elaborou uma ferramenta que permite calcular os ganhos económicos com a saúde conseguida com modos de transporte ativos como o circular a pé ou de bicicleta – a «WHO/Europe Health Economic Assessment Tool (HEAT)» disponível em http://www.heatwalkingcycling.org/  
[16] «The public health efforts to increase physical activity have so far focused largely on education and skill development in individuals, and on physical activity as leisure. Rarely have they considered environmental determinants of people’s choice of and ability to maintain regular physical activity, and built on these to design interventions to promote physical activity (…) Policies promoting a shift towards more walking and cycling as transport modes should concentrate on the trips for which motorized modes are often used but whose length easily permits their completion on foot or by bicycle; this applies to many trips shorter than 5 km (…) Public and non-motorized transport offer opportunities for regular physical activity, integrated into daily life at minimal cost, for large segments of the population. Modal shifts to physically active transport are likely to bring major benefits to public health, the environment and quality of life, and to decrease congestion. Strategies designed to engineer such shifts should be energetically pursued, especially in urban and suburban areas, and their effects monitored and evaluate» (Dora 2000:32-33)
[17] O repensar da quantidade de veículos automóveis a motor pode implicar, aliás, uma menor necessidade de piso asfaltado quer em quilometragem quer em número de vias quer em espaço de estacionamento para veículos automóveis. Aspetos que podem conduzir a uma menor impermeabilização do solo com benefícios importantes na questão do escoamento de águas pluviais e na possibilidade da existência de mais áreas verdes urbanas e hortas urbanas, por exemplo; vide European Commission’s Directorate-General Environment, Science for Environment Policy - In-depth Reports - Soil Sealing, March 2012 para mais sobre a impermeabilização de solo in http://ec.europa.eu/environment/integration/research/newsalert/pdf/IR2.pdf
[18] Em 2009 e 2010 houve várias propostas de alteração ao Orçamento de Estado, não aprovadas, destinadas a promover e apoiar a utilização da bicicleta, designadamente através de dedução em sede de IRS e redução da taxa de IVA aplicável relativamente à aquisição de bicicleta, por parte de vários partidos com assento na Assembleia da República e de um movimento de cidadãos
[19] Como já se faz na Bélgica e na Holanda e se está em vias de fazer em França – vide quanto ao caso belga «A vélo au boulot (…) Vous ne perdrez plus de temps à trouver un emplacement de parking, et il est prouvé qu'aux heures de pointe, vous vous déplacerez beaucoup plus vite qu'en voiture. En plus, cela vous donne l'occasion de garder la forme. Enfin, une indemnité peut vous être accordée par votre employeur. Elle est nette d'impôt jusqu'à hauteur de 0,22 €/km au maximum» in http://www.bruxellesmobilite.irisnet.be/articles/velo/a-velo-au-boulot; já quanto ao caso francês: «Depuis le 2 juin dernier [2014], 19 structures testent le versement d’une indemnité kilométrique aux employés qui viennent travailler à vélo. Menée au niveau national à la demande du secrétariat d’Etat en charge des transports, l’opération concerne potentiellement les quelque 10 000 employés des 19 structures. Durant les 6 mois d’étude, chaque employé qui enfourchera son vélo touchera ainsi 25 centimes d’euro du kilomètre parcouru. Si cette indemnité kilométrique, à la charge de l’entreprise, n’est théoriquement pas cumulable avec le remboursement d’un abonnement de transports collectifs, une dérogation existe pour les volontaires qui sont dans l’obligation de cumuler vélo et train pour aller travailler.» vide http://www.univers-nature.com/actualite/une-indemnite-kilometrique-pour-aller-travailler-a-velo-66137.html
[20] São produzidas cerca de um milhão de bicicletas para exportação por ano segundo http://videos.sapo.pt/7KPtsQZhbpHKK8WIjOOh (Redução de Impostos sobre a Bicicleta - Fabricantes pedem incentivos fiscais para maior uso do veículo)
[21] Anteprojeto de Reforma da Fiscalidade Verde, pp. 139-140
[23] Como já se faz na Bélgica e na Holanda e se está em vias de fazer em França – vide quanto ao caso belga «A vélo au boulot (…) Vous ne perdrez plus de temps à trouver un emplacement de parking, et il est prouvé qu'aux heures de pointe, vous vous déplacerez beaucoup plus vite qu'en voiture. En plus, cela vous donne l'occasion de garder la forme. Enfin, une indemnité peut vous être accordée par votre employeur. Elle est nette d'impôt jusqu'à hauteur de 0,22 €/km au maximum» in http://www.bruxellesmobilite.irisnet.be/articles/velo/a-velo-au-boulot; já quanto ao caso francês: «Depuis le 2 juin dernier [2014], 19 structures testent le versement d’une indemnité kilométrique aux employés qui viennent travailler à vélo. Menée au niveau national à la demande du secrétariat d’Etat en charge des transports, l’opération concerne potentiellement les quelque 10 000 employés des 19 structures. Durant les 6 mois d’étude, chaque employé qui enfourchera son vélo touchera ainsi 25 centimes d’euro du kilomètre parcouru. Si cette indemnité kilométrique, à la charge de l’entreprise, n’est théoriquement pas cumulable avec le remboursement d’un abonnement de transports collectifs, une dérogation existe pour les volontaires qui sont dans l’obligation de cumuler vélo et train pour aller travailler.» vide http://www.univers-nature.com/actualite/une-indemnite-kilometrique-pour-aller-travailler-a-velo-66137.html
[24] Anteprojeto de Reforma da Fiscalidade Verde, pág. 140
[25] Sistemas de Bicicletas Partilhadas ou Sistemas de Velocípedes Partilhados
[26] Anteprojeto de Reforma da Fiscalidade Verde, pág. 140